Entre livros e grades


 A mudança no comportamento do sentenciados por meio da leitura foi comprovado por pesquisa  da Universidade de Brasília
Uma pesquisa feita com 200 internos do Sistema Penitenciário do Distrito Federal apontou uma predisposição deles à prática da leitura, o que vai de encontro com a análise da formação de novos leitores fora dos presídios. A pesquisa mostrou que 70% dos sentenciados tornaram-se leitores assíduos com a leitura de quatro livros/mês, enquanto a média da população é de 4 livros/ano. “Fizemos a pesquisa por dois anos e constatamos que houve mudanças no vocabulário e na forma que eles se enxergam como indivíduo”, contou a responsável pela pesquisa, a pesquisadora da Universidade de Brasília – Unb, Maria Luzineide. Durante a pesquisa, ela aplicou questionários entre 200 internos da Penitenciária do Distrito Federal I (PDF I) e da Penitenciária Feminina do Distrito Federal (PFDF).  
 Outra constatação foi que a leitura já era uma constante na vida das leitoras. Diferente dos presos que adquiriram a prática da leitura somente após o cárcere. “Aprendi a passar o tempo com a leitura. Ao invés de ver um filme, a gente lê um filme”, contou o sentenciado Carlos Anderson, que cumprirá pena até 2015.Ele lê ao menos 50 páginas de livro diariamente. O vocabulário e a linha de raciocínio dos sentenciados que têm contato com a leitura é muito diferente do restante da massa carcerária. Carlos, que tem preferência por livros jurídicos, confirma o dado de que, para 50% dos sentenciados, a leitura é uma forma de adquirir conhecimento. “Ler livros nos faz ler e falar melhor, além de deixar nosso cotidiano menos monótono”, disse ele. A pesquisa ainda concluiu que para 24% dos homens a leitura representa prazer e para 10% refúgio. Já para as mulheres presas, o ato de ler é uma maneira de não sentir saudade da família e para 50% delas é para adquirir conhecimento.
 Remissão
O Projeto de leitura e produção escrita – Portas Abertas – desenvolvido pela UnB com internos do Sistema Penitenciário do Distrito Federal teve início em março deste ano. O objetivo do projeto é qualificar o tempo na cela, de maneira sistemática, com a leitura de obras predeterminadas. Nesse projeto, o interno terá contato com obras consagradas da literatura brasileira.
 O Portas Abertas segue a orientação da Portaria n° 276 do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), aprovada em junho do ano passado. A Portaria determina que o preso pode diminuir até 48 dias de pena se ler um livro mensalmente e apresentar uma resenha sobre cada obra ao fim de cada mês. A cada livro lido, quatro dias da pena podem ser remidos.
 Inicialmente o Projeto seria desenvolvido apenas na PDF I, mas foi estendido para Penitenciária do Distrito Federal II (PDF II), em que será feito um trabalho com internos envolvidos em crimes sexuais. Os 200 internos que fazem parte do projeto foram selecionados pelo grau de instrução. Para fazer parte ele precisava estar cursando  do 9º ano ao ensino médio.
 Além do incentivo à leitura, o Projeto propõe rodas de conversa sobre temáticas variadas. Esses encontros ocorrerão periodicamente para discussões a respeito da leitura realizada. Após ler o livro, o aluno produzirá um texto no formato de resenha. Nesse período, as atividades de leitura poderão contar como remissão, se for permitido pelo juiz da Vara de Execução Penal (VEP). Na próxima semana, a UnB vai enviar para o juiz da VEP as primeiras avaliações feitas dos alunos para que ele faça a análise e homologue os dias remidos. “Esse projeto é muito especial. O interno tem mesmo que ter acesso à leitura e poder remir sua pena da mesma forma que já ocorre com o estudo e trabalho. É importante que o interno tenha esse contato com os livros para a ressocialização, ocupação do tempo e para que ele saia do sistema penitenciário mais instruído”, analisou Cláudio Moura Magalhães, subsecretário do Sistema Penitenciário. Um projeto semelhante, seguindo a mesma orientação do DEPEN, já existe na penitenciária de Campo Grande (MS).
 Bibliotecas
Existem duas bibliotecas no PDF I, a Biblioteca Monteiro Lobato, criada pela Fundação de Amparo ao Trabalhador Preso (FUNAP) junto da Subsecretaria do Sistema Penitenciário (SESIPE), e a Biblioteca Graciliano Ramos, doada pela Casa do Saber, projeto de leitura criado por empresa do Distrito Federal.  O acervo das duas bibliotecas é de 8 mil livros, que atualmente estão sendo cadastrados, para serem controlados por sistema informatizado, e os danificados serão recuperados.
 O Núcleo de Ensino e Aperfeiçoamento do PDF I iniciará, no próximo semestre, o projeto Carrinho do Livro, em que serão distribuídos seis livros por cela em um carrinho.  “A cada 15 dias vamos trocar esses livros entre as celas. Esperamos formar ainda mais leitores”, explicou o chefe no Núcle, Dalton Neiva. 
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BRB